Uma falange de espíritos
05/12/2011 16:47
Uma falange de espíritos
O Espírito Santo ou uma Falange de Espíritos? “Pois ele será grande diante do Senhor, não beberá vinho nem bebida forte e será cheio do Espírito Santo, já do ventre materno” (Lc 1:15).
Outro dia chegou-me às mãos um livro da tradição espírita – kardecista intitulado : “ Razão e Dogma” . Em suas 190 páginas o autor trata de fazer uma apologia apaixonada do espiritismo. Para que seu intento seja alcançado, ele está disposto a combater usando a própria arma do inimigo – a Bíblia Sagrada. É do conhecimento geral que a Bíblia Sagrada não é aceita pelos espíritas da mesma forma que ela é aceita pelos evangélicos. Para estes ela é regra de fé, a palavra infalível de Deus, para aqueles ela é um livro que até mesmo tem a sua “inspiração”, mas está longe de ser a absoluta palavra de Deus. Assim sendo, onde o autor encontra um texto da Bíblia que supostamente apóia suas crenças, então ele está disposto a exaltá-la, mas se o texto se volta contra sua argumentação, então a tática agora é atacá-la demonstrando que o livro Sagrado está cheio de erros e contradições. Não fosse os comentários feitos pelo colega kardecista que mo emprestou, não teria razão suficiente para lembrar esse fato. A final aquele livro não dizia nada de novo sobre o pensamento espírita – kardecista, além daquela já conhecida aversão que os mesmos demonstram pela doutrina evangélica. O que talvez não seja ainda do conhecimento do grande público evangélico, é a forma sutil como esse autor trata alguns textos bíblicos nesse livro; Para demonstrar que está sendo fiel ao texto sagrado, ele diz contar com o apoio de “especialistas em grego ” (língua na qual o Novo Testamento foi escrito) que ratificam o que ele escreveu. Pois bem, havia uma euforia estampada no rosto do meu colega, como se ele dissesse com outras palavras, que ali estava finalmente a prova de que os protestantes estavam laborando em insidioso erro em suas crenças, especialmente no que diz respeito à pessoa do Espírito Santo, que segundo aquele livro não se trata de uma única pessoa (a terceira pessoa da trindade como ensina a Bíblia), mas de um dos membros da grande “falange de espíritos” que povoam o universo. Em palavras mais simples, a argumentação dele era que na verdade o que existe são os “espíritos bons” e não um único “ Espírito Santo”. Na sua tentativa de demolir a crença cristã na divindade e personalidade do Espírito Santo, o autor diz está disposto a recorrer ao texto original do Novo Testamento a fim de limpar a Palavra de Deus das “intromissões” e “ erros grosseiros de tradução” cometidos pelo homem . Para isso invoca a figura de um confrade espírita de nome Caibar Schultel, segundo ele um “profundo conhecedor das Escrituras” e, um outro escritor também espírita de nome Pastorino, este último “conhecedor das Escrituras, nas letras gregas” (pg.44-45). Ao falar sobre o termo grego espírito (pneuma), Schultel diz que “esta palavra, S. Jerônimo traduziu-a como “spiritus” reconhecendo com os Evangelistas que há bons e maus. Só depois é que surgiu a idéia de divinizar os Espíritos e só depois da vulgata é que a palavra “sanctus” foi constantemente ligada á palavra “spiritus”.(pg.44, os grifos são meus). Evidentemente não há fundamento nestas palavras de Schultel, pois, muito tempo antes do advento da Vulgata latina (que só apareceu no IV século), o Novo Testamento no original grego já associava a terceira pessoa da santíssima trindade o adjetivo “Santo”. Paulo, por exemplo, associou a palavra “santo” (gr. Hagios) ao Espírito de Deus, denominando-o de “Espírito Santo” (At. 20:23), da mesma forma os apóstolos ao endereçarem uma carta aos cristãos de origem gentílica, disseram: “ pois pareceu bem ao Espírito Santo e a nós não vos impor maior encargo além destas coisas essenciais” (At. 15:28). Há inúmeros outros textos no Novo Testamento mostrando esse fato. Mas o exegeta preferido do autor é Pastorino, a quem recorre constantemente para fundamentar suas declarações. Citando Pastorino, ele afirma que a expressão “Espírito Santo” na maioria das vezes, não é precedida por artigo definido. Havendo, portanto erro nas traduções correntes, já que o certo é a afirmação: Um espírito santo” ou “um santo espírito”. (pg.45). Em seguida dá como exemplo a seguinte tradução de Pastorino para Lc.1:15 : “porque ele (João Batista) será grande diante do Senhor e não beberá vinho nem bebida forte; já desde o ventre de sua mãe será cheio de um espírito santo” (pg.46). Para que ninguém esqueça, relembra : “Note-se que no original grego não há o artigo, o que demonstra a indeterminação: “Um espírito santo, e não O Espírito Santo” (pg.46). Apenas uma página adiante, agora se referindo a mãe de João Batista, o autor recorre novamente as seguintes palavras de Pastorino: “Isabel ficou cheia de um espírito santo. Novamente sem artigo. Repisamos: a língua grega não possuía artigos indefinidos. Quando a palavra era determinada, empregava-se o artigo definido “o, he, to”. Quando era indeterminada (caso em que nós empregamos o artigo indefinido), o grego deixava a palavra sem artigo. Então quando não aparece em grego o artigo, temos que colocar, em português, o artigo indefinido: Um espírito santo, e nunca traduzir com o definido: O espírito santo”.(pg.47). Impressiona-me a forma superficial como esses autores tratam a língua grega. Em especial quando se referem ao uso do artigo em grego. Ao falar da gramática grega, o Dr. William Sanford Lasor, conhecedor de 20 línguas e autor de um manual de língua grega, classifica a gramática grega como sendo “uma das mais complexas do mundo” No apêndice do clássico dicionário de língua grega de W. E. Vine, encontramos 64 páginas dedicadas exclusivamente à análise do uso do artigo grego e das inúmeras regras que o regem . Da mesma forma Archibald Thomas Robertson em sua monumental gramática de Grego com suas 1454 páginas, reserva mais de 40 delas para mostrar as várias regras que regulamentam o uso do artigo grego . Em sua gramática de grego o Dr. H.E.Dana, trata do mesmo assunto em quase 20 páginas . Se as regras que regem o uso do artigo grego são tão complexas, como então se pode dizer tudo sobre elas em apenas um parágrafo? Vejamos novamente o que o autor disse acerca do uso do artigo grego: “quando não aparece em grego o artigo, temos que colocar, em português, o artigo indefinido: Um espírito santo, e nunca traduzir com o definido: O espírito santo”. Para o autor o texto bíblico não está se referindo à pessoa do Espírito Santo, a terceira pessoa da trindade, pela simples razão de que no texto grego o substantivo pneuma (espírito) não vem precedido de artigo, e segundo a sua regra “quando não aparece o artigo definido, deve-se colocar o indefinido”. Daí a conclusão que a referência não é à pessoa específica do Espírito Santo, mas a um espírito bom qualquer, ou a um espírito de luz, ou ainda a um espírito mais evoluído. Vamos tentar aplicar essa “regra” supracitada para alguns textos do Novo Testamento grego. 1. Jo.1:6 “ Houve um homem enviado (...) seu nome era um João ( no texto grego o nome João não vem precedido de artigo) . Pelas regras de nossos “eruditos”, a referência aqui deverá ser a um João qualquer e não a João Batista, já que no texto grego não há o artigo definido antes da palavra João. Qualquer pessoa que tem bom senso e já leu o capítulo primeiro do evangelho de João, sabe que a referência é claramente a João Batista e não a um João qualquer. LEIA TEXTO NA ÍNTEGRA NO LIVRO: DEFENDENDO O VERDADEIRO EVANGELHO (CPAD, 2009
Autor: José Gonçalves